segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

ARLINDO CRUZ E SOMBRINHA

Dupla nota dez

Sombrinha e Arlindo são

os clássicos do samba atual


Por Julio Cesar Cardoso de Barros

Uma crítica que se faz ao samba atual é que ele não gerou nenhum nome digno de habitar o panteão do gênero. Não temos mais um Wilson Batista, um Geraldo Pereira ou um Noel Rosa. O mesmo se dizia há trinta anos. E lá estavam Cartola e Nelson Cavaquinho, hoje imortalizados por uma obra exuberante. O samba é um estilo musical em que o talento leva muito tempo para ser reconhecido, mas atualmente há compositores dignos de figurar em qualquer antologia. Entre eles, Sombrinha e Arlindo Cruz, que acabam de lançar o CD Da Música. Sombrinha é um compositor que saiu de São Vicente, no litoral paulista, para encaminhar sua vocação nos terreiros cariocas, onde integrou a primeira formação do Grupo Fundo de Quintal. Lá, conheceu Arlindo, um carioca criado no samba de Madureira. Há seis anos, deixaram o grupo para gravar álbuns-solo, mas se juntaram para shows, sempre com casa cheia. A conseqüência foi esse Da Música, que é quase uma ode à Madureira de Arlindo, com a sua Império Serrano e a velha Portela, homenageadas em faixas assinadas por Candeia, Ivone Lara e no partido-alto Eu Não Sou o que Ela Pensou, do falecido Jorge Pessanha, um parceiro do legendário Silas de Oliveira, o maior compositor de samba-enredo.
Sombrinha e Arlindo são compositores que não se satisfazem com a seqüência fácil das melodias de três acordes que lançaram a música brasileira num poço de monotonia. Nos sambas mais lentos, eles passeiam por dissonâncias refinadas com as quais vestem letras singelas que tratam do dia-a-dia, de problemas sociais e do amor. O disco abre com uma seleção de partido-alto, bate continência para a Bahia no samba-de-roda Pelô Céu, Pelô Chão e volta correndo para o Morro da Serrinha com Pintou uma Lua Lá, de Beto Sem Braço, o autor do antológico Bumbum Paticumbum, Prugurundum. Da Música é uma boa mostra do que há de melhor no gênero e traz sambas fortes, como O Filho do Quitandeiro, que esquentarão os terreiros do centro-sul do país, provando que samba bom não viaja de jatinho, mas também não está restrito às prateleiras dos museus do disco.

VEJA, 05/06/1996. 


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