terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

DOLORES DURAN

Da fossa à bossa



Por Julio Cesar Cardoso de Barros


Nascida no Rio de Janeiro, em 7 de junho de 1930, Dolores Duran morreu muito jovem, aos 29 anos de idade, no dia 24 de outubro de 1959. Batizada Adiléia Silva da Rocha, era um dos quatro filhos de um sargento da Marinha. Cresceu no bairro de Pilares, subúrbio carioca da Central. Aos 10 anos participou do programa Calouros em Desfile, que Ary Barroso apresentava na Rádio Tupi, vencendo o concurso com a nota máxima. Foi o ponto de partida para uma carreira curta, mas intensa. 

Depois de trabalhar no rádio-teatro da Tupi, de atuar em várias peças infantis no Teatro Carlos Gomes e tentar a carreira de cantora na Rádio Nacional, ela foi contratada pela boate Vogue, onde cantava músicas nacionais e estrangeiras de sucesso. Tinha só 16 anos de idade. Casa noturna refinada de Copacabana, de propriedade do Barão Von Stuckart, a Vogue abriu-lhe  as portas da agitada noite do Rio, onde ponteavam night clubs como o Beguine (Hotel Glória), o Little Club (no Beco das Garrafas, em Copacabana) e o Casablanca (na Urca). Conheceu a boemia, se enturmou e em pouco tempo era uma das figuras mais conhecidas e constantes daquele ambiente.
Em 1951 gravou seu primeiro disco pela gravadora Star com os sambas Que Bom Será, de Alice Chaves, Salvador Miceli e Paulo Marquez, e Já Não Interessa, de Domício Costa e Roberto Faissal. No ano seguinte, fincou o pé na dor de cotovelo, ao gravar o samba-canção Um Amor Assim, de Dora Lopes, e  o samba Outono, de Billy Blanco. A vocação para a fossa, que começava a dominar a cena noturna da velha capital federal, ficou patente no samba-canção antológico Canção da Volta, que ela gravou com sucesso em 1954, imprimindo seu estilo sofrido à dolorida poesia de Antonio Maria:


Nunca mais vou fazer

O que o meu coração pedir
Nunca mais vou ouvir
O que o meu coração mandar
O coração fala muito
E não sabe ajudar
Sem refletir
Qualquer um vai errar, penar



Ouça Canção da Volta, com Dolores:


A intérprete crescia e ganhava porte, quando compôs sua primeira canção, Se É Por Falta de Adeus, em parceria com ninguém menos que Tom Jobim, sucesso na voz de Dóris Monteiro, que nunca deixou de cantá-la:


Se é por falta de adeus


Vá-se embora desde já

Se é por falta de adeus
Não precisa mais ficar




Dolores Duran: clássicos da dor de cotovelo 

Com Jobim ela faria uma das melhores canções do período: Por Causa de Você, um clássico da dor de cotovelo pré-bossa nova:


Ah! Você está vendo só

Do jeito que eu fiquei
E que tudo ficou
Uma tristeza tão grande
Nas coisas mais simples que você tocou
A nossa casa, querido
Já estava acostumada aguardando você
As flores na janela
Sorriam, cantavam por causa de você



Nanda Costa dubla Dolores em Por Causa de Você:


Quando a morte a encontrou na sala de seu apartamento de Ipanema, ela estava no auge, tinha um programa na TV Rio e suas músicas faziam chorar as mulheres apaixonadas com canções como A Noite do Meu Bem (“Hoje eu quero a rosa mais linda que houver/ E a primeira estrela que vier/ Para enfeitar a noite do meu bem”) e Fim de Caso (“Eu desconfio que o nosso caso está na hora de acabar/ Há um adeus em cada gesto, em cada olhar/ Mas nós não temos nem coragem de falar”). Ela morreu deixando uma marca forte na música daquela década. O ambiente aconchegante das boates, que pedia uma interpretação menos arrebatada do que a que predominou na música brasileira ao longo das décadas, forjou o jeito intimista e fez de Dolores uma precursora dos intérpretes da nascente Bossa Nova. No dia de sua morte, ela chegou em casa às 7 horas da manhã, depois de cantar a noite toda no Little Club, e ordenou à empregada: “Não me acorde. Vou dormir até morrer”.


VEJA.COM 27/09/2010

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