Por Julio Cesar Cardoso de Barros
Antonio Candeia Filho nasceu no dia 17 de agosto de 
1935 e morreu no dia 16 de novembro de 1978 na cidade do Rio de Janeiro. Filho 
de um tipógrafo que tocava flauta, o menino Candeia cresceu no meio de músicos, 
nas festas que seu pai promovia ao som do choro e do samba. Jovem dinâmico, 
Candeia tocava violão e cavaquinho, jogava capoeira e frequentava terreiros de 
candomblé. Vítima de uma fatalidade, foi parar numa cadeira de rodas, seguiu em 
frente e se tornou mentor e mito entre os sambistas. Compôs em 1953, aos 17 
anos, seu primeiro samba-enredo, Seis Datas Magnas, com Altair Marinho, 
o Prego, levando a Portela ao 
título com notas dez em todos os quesitos. Foi a primeira de seis vitórias no 
concurso interno de samba-enredo da escola. Compôs também Festas Juninas em 
Fevereiro (com Valdir 59), de 1955, classificando a escola em terceiro 
lugar no desfile. Em 1957, o samba-enredo Legados de D. João VI (também 
com o irmão), levou a escola a novo título.
Voltou a vencer em 1959 com Brasil, 
Panteão de Glórias (com Casquinha, Bubu, Valdir 59 e Picolino) e a 
Portela obteve mais um título no carnaval carioca. No ano do IV Centenário do 
Rio de Janeiro, o samba Histórias e Tradições do Rio Quatrocentão deu à 
agremiação de Osvaldo Cruz a terceiro colocação. Seus sambas-enredo, no entanto, 
não fizeram o mesmo sucesso que seus partidos-altos, cujos refrões são cantados 
até hoje nos terreiros de samba de norte a sul do país. É o caso de 
Filosofia do Samba, gravado por Paulinho da Viola. Ouça esse samba no seguinte endereço:
Vem sambar Iaiá
Vem sambar ioiô
Iaiá, Ioiô
Vem sambar ioiô
Iaiá, Ioiô
Essas letras animam as rodas em que os cantores improvisam versos, que 
intercalam com o refrão. Candeia era também um mestre improvisador. Alguns de 
seus versos improvisados se tornaram tão famosos que foram gravados junto com 
refrões de terceiros, como se fizessem parte da música original. Seus dotes de 
partideiro foram imortalizados em três álbuns denominados Partido em 5, 
lançados entre 1975 e 1977, com a participação de outros quatro sambistas. No 
início dos anos 60, Candeia dirigiu o conjunto Mensageiros do Samba e participou 
do movimento de revitalização do samba promovido pelo Centro Popular de Cultura, 
CPC. Mas o que poderia dar em militância política gorou, quando ele entrou para 
a polícia. Foi um policial truculento, que acabou se afastando do convívio dos 
antigos companheiros. Várias vezes interrompeu rodas de samba por perturbação da 
ordem pública, estranhando os amigos e sua origem. Contam que certa vez chegou a 
prender o próprio parceiro, Valdir 59. Certo dia enquadrou o ainda desconhecido 
Paulinho da Viola, que jogava sinuca num bar.
Uma discussão, um tiro: Candeia na cadeira de rodas
Numa discussão de trânsito, em 
1965, desceu do carro e descarregou o revólver contra o motorista de um 
caminhão, que revidou, acertando-lhe um tiro na coluna vertebral. Candeia ficou 
paraplégico. A tragédia transformou sua vida. Ou o devolveu às suas origens. Na 
letra de seus sambas se podem notar os reflexos de seu sofrimento:
Se eu tiver que chorar
Choro cantando
Pra ninguém 
me ver sofrendo
E dizer que estou pagando
 E foi cantando que ele chorou. Mas Candeia ergueu a cabeça e firmou-se como 
líder entre os grandes sambistas cariocas. Passou a reunir a fina flor do samba 
em sua casa para memoráveis pagodes de fundo de quintal. O compositor e 
partideiro estava em plena forma e encantava a todos com bons sambas de melodia 
rica. Tirá-lo de casa, no entanto, foi tarefa difícil. Em cadeira de rodas, 
temia que sentissem pena dele. Até que um dia os amigos conseguiram fazê-lo se 
reencontrar com o público. Foi numa noite, no Teatro Opinião. A casa cheia de 
amigos e convidados, ele entrou em sua cadeira de rodas e foi cantando um samba 
novo, De Qualquer Maneira, ao som de um violão:
Sentando em trono de rei
Ou aqui nesta cadeira
Eu já 
disse, já falei
Que eu canto de qualquer maneira
Quem é bamba não 
bambeia
Digo com convicção
Enquanto houver samba nas veias
Empunharei 
meu violão
De qualquer maneira meu amor eu canto
De qualquer maneira, meu 
encanto
Eu vou cantar
Poucos conseguiram conter as lágrimas. A peça É sangue na veia, é 
Candeia, de Eduardo Rieche, vencedora do concurso nacional de dramaturgia 
promovido pelo CCBB, em 2007, mostrou a cena. Candeia lutou contra a melancolia 
até o fim da vida, mas ela não o abandonou. Nos versos de Preciso Me 
Encontrar (gravado por Cartola e mais recentemente por Marisa Monte), a 
sombra da tragédia pessoal:
Deixe-me ir, preciso andar
Vou por 
aí a procurar
Sorrir pra não chorar
Quero assistir o sol 
nascer
Ver as águas do rio correr
Ouvir os pássaros a 
cantar
Eu quero nascer, quero viver
Deixe-me ir, preciso 
andar
Vou por aí a procurar
Cena da peça É Sangue na Veia, É 
Candeia
Ouça Marisa Monte:
Em 1970 lançou seu primeiro LP, Candeia (relançado como Samba da 
Antiga, em 1975) e, em 1971, um segundo disco, Seguinte… Raiz 
Candeia, no qual se destaca Quarto Escuro, de tom romântico 
e melancólico:
Não acende a luz dentro do quarto
Volto para os teus braços 
aceso de amor
Deixei lá fora os meus fracassos
Meus 
lábios contaram-me os segredos
Verdade do amor sem medo
A melancolia e o tom soturno dos sambas líricos de Candeia reaparecem naquele 
que é apontado como seu melhor disco, Axé, de 1978. Na faixa 
Pintura Sem Arte, ele chora:
Me sinto igual a uma folha caída
Sou o adeus de quem 
parte
Para quem a vida é pintura sem arte
Ouça Pintura Sem Arte:
Outra faixa desse disco, Amor não é brinquedo, pinta com cores 
fortes velhas cicatrizes:
Se estás procurando distração
O romance terminou mais 
cedo
Peço por favor
Pra não brincar com meu 
segredo
Verdadeiro amor não é brinquedo
Aos jovens que o procuravam para mostrar seus sambas, sempre dava conselhos: 
“Estude, sem estudo você nunca será nada na vida”. Respeitado no morro e no 
asfalto, Candeia foi um militante negro avesso ao preconceito de mão invertida. 
Jamais fez distinção entre negros e brancos, que ele sabia estarem igualados na 
luta pela vida. Aos cultores de africanismos e americanismos ele contrapunha 
estes versos:
Eu não sou africano
Nem norte-americano
Ao som da 
cuíca e pandeiro
Sou mais o samba brasileiro
 Sem radicalismos, cantou as desigualdades sociais, exaltou o samba e a 
cultura negra, cultuou os orixás. Mesmo não chamando para si uma missão, virou 
um mito, líder de uma resistência que se confundia com a oposição à ditadura 
militar. Mas sua preocupação maior era cultural. Convencido de que a escola de 
samba era uma “árvore que perdeu a raiz”, deixou a Portela, que julgava 
descaracterizada, e com um punhado de companheiros fundou, em dezembro de 1975, 
o Grêmio Recreativo de Arte Negra e Escola de Samba Quilombo, sob a bandeira do 
“samba autêntico”. Candeia chegou a escrever um livro com suas críticas à forma 
como as escolas se apresentavam àquela altura e, de modo saudosista, indicando 
como saída a retomada de tradições antigas, que os sambistas por motivos os mais 
variados haviam abandonado. Trata-se de Escola de Samba – Árvore que 
Esqueceu a Raiz, Antônio Candeia Filho e Isnard Araújo, Editora Lidador, 
1978. A saga da criação da Quilombo foi mostrada no documentário Eu sou o 
povo (2008), de Bruno Bacellar, Luiz Fernando Couto e Regina Rocha.
 Ouça o belo samba da Quilombo de 1978, Ao Povo 
em Forma de Arte, de Wilson Moreira e Nei Lopes, cantado no Fantástico:
Doce ilusão. Candeia morreu e com ele a escola, que desfilando fora das 
passarelas oficiais saiu pela última vez em 2003. Um núcleo remanescente ainda 
realizou até recentemente rodas de samba na sede, na Fazenda Botafogo, em Coelho 
Neto, bairro da Zona Norte carioca, e movimentou um vagão no Trem do Samba, que 
todo ano, por ocasião do Dia Nacional do Samba (2 de dezembro), sai da estação 
da Central até Osvaldo Cruz carregado de sambistas. A face dura e militante e as 
emboscadas do destino não conseguiram esconder o homem afável, justo e de grande 
sensibilidade no qual Candeia se transformou. Mais conhecido por seus sambas de 
partido alto, Candeia deixou uma vasta coleção de sambas líricos, menos 
conhecidos. Em sua curta existência de 43 anos, ele amou e soube como poucos 
cantar esse sentimento.
DISCOGRAFIA
Candeia 
(1970) – Equipe - LP (relançado como Samba da Antiga, em 
1975)
Seguinte…Raiz Candeia (1971) 
- Novo Esquema - LP
Filosofia do Samba (1971)
Quatro grandes do samba (c/ Elton 
Medeiros, Guilherme de Brito e Nelson Cavaquinho) (1977) - RCA Victor - LP
Candeia e Elton Medeiros - Coleção 
Nova História da Música Popular Brasileira (1978) - Abril Cultural – 
LP
Candeia (1988) – 
Funarte – LP






















 
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