terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

CYRO PEREIRA

Do Jequibau à Jazz Sinfônica



Por Julio Cesar Cardoso de Barros



O maestro Cyro Pereira morreu no dia 9 de junho de 2011, vítima de câncer aos 81 anos. Cyro começou a carreira de arranjador de orquestra no final da década de 40, foi professor de orquestração na Unicamp, diretor da orquestra da Record nos tempos áureos dos festivais e era maestro, compositor residente, arranjador e um dos fundadores da Orquestra Jazz Sinfônica. Com o pianista Mário Albanese, criou nos anos 60 um novo ritmo, derivado do samba, ao qual denominaram Jequibau, no qual inovavam com o compasso de cinco tempos. O velório do maestro Cyro Pereira foi  no Memorial da América Latina. O corpo foi cremado na Vila Alpina. No mês de agosto de 1965, os músicos paulistas Mário Albanese e Cyro Pereira lançaram um disco com as músicas Jequibau e Esperando o Sol. O LP surpreendeu o meio artístico pelo inusitado de apresentar um ritmo até então inédito na música brasileira: o 5/4 (compasso de cinco tempos), que batizaram de Jequibau. Advogado formado pela Faculdade de Direito de São Paulo, Albanese já era radialista e, assim como Cyro, músico conhecido, tendo já conquistado dois discos de ouro com as músicas Você, na voz de Marina Barbosa, e Insônia, que ele próprio gravou ao piano. Hoje, Cyro Pereira é diretor da Orquestra Jazz Sinfônica do Estado de São Paulo e Mário Albanese é assessor da presidência da Cetesb – Companhia de Tecnologia e Saneamento Ambiental -, cedido temporariamente para a Prodesp, empresa de processamento de dados do Estado, onde desenvolve uma campanha institucional de combate ao fumo.


Cyro com Albanese

Jequibau, o disco – Quando o disco começou a ser executado, o público não sabia se estava ouvindo um samba tocado por músicos de jazz ou se era o contrário. “As pessoas não estavam acostumadas”, lembra Albanese. Era algo diferente, mas sem dúvida inserido no rol dos ritmos brasileiros, um aparentado do samba, que tem como característica um compasso de quatro tempos. Convidado para gravar um LP inteiro só com jequibau, nos Estados Unidos, Albanese entrou em pânico. “Nós não estávamos preparados para o mercado. Aquilo era apenas o resultado de nossas pesquisas”, diz. Ligou para Cyro e começaram a compor as faixas do disco Jequibau, lançado primeiro nos Estados Unidos, depois no Brasil, França, Itália, Argentina e México. Albanese, que já tinha músicas suas gravadas por grandes nomes da música brasiileira, como Agostinho dos Santos, Pedrinho Mattar, Isaura Garcia e Cauby Peixoto, passou a ter seus jequibaus impressos na interpretação de astros internacionais da expressão de Andy Williams, Sadao Watanabe e Herb Alpert. Hoje, aos 55 anos, e com quarenta músicas nesse ritmo editadas e dezenas inéditas, ele continua sendo gravado e, vez por outra, recebe novas propostas de grupos de dança moderna interessados em coreografar suas composições.

O disco: compasso de cinco tempos

Apesar de ter ganhado algum dinheiro, Albanese e seu parceiro não tiraram o devido proveito da situação e deixaram escapar a chance de transformar o jequibau numa boa fonte de dólares. “Se eu tivesse ido para os Estados Unidos, na época, e se soubesse explorar o mercado como faz esse pessoal hoje com a lambada, a história seria outra”, avalia. Vinde e cinco anos depois, Albanese só fica contrariado quando pensa nos direitos de autor, que não são devidamente respeitados no Brasil. Por conta disso, todo ano, no Dia Nacional do Direito Autoral, remete às emissoras de rádio e às redações de jornais e revistas um manifesto em que expressa a sua revolta. “Pode não dar resultado, mas não posso deixar passar em branco. Alguma coisa tem de ser feita”. *VEJA/5/9/1990.

DEPOIMENTO DE HOWARD FRANÇA

Cyro: um talento respeitado entre os músicos

Tive a felicidade de conviver com os dois, o maestro na época da grande TV Record, Show do dia 7, Corte Rayol Show, programa do principe Roni Von, nas tarde de domingo com o Rei Roberto Carlos, o maestro, sempre uma pessoa de educação irreparável, calmo e tranquilo, nutria para com todos os músicos um enorme e reconhecido respeito. Eu fazia parte do trio Salinas que acompanhava naquela oportunidade os shows de Agnaldo Rayol, Moacyr Franco e outros artistas, posto que éramos contratados pelo escritório do mega-empresário Marcos Lázaro. O maestro Cyro Pereira sempre mereceu de todos músicos enorme respeito, todos os arranjos para ele reger eram ensaiados com todo o carinho, enquanto não estivesse tudo limpinho ele não sossegava. Nessa nossa convivência com o Theatro Record, a amizade com as estrelas do momento era inevitável, algumas eram dotadas do “não me toques”, afinal ali era a meca do mundo artístico, mas a maioria era solícita e amigável, e uma dessas criaturas simples era a cantora Claudia, que pela qualidade como cantora causava enormes ciúmes às estrelas do momento. Sempre ao lado dela estava o maestro Mario Albanese, pessoa simples, de um conhecimento musical impressionante. Lembro-me do dia em ele foi me mostrar o Jequibau, que como baterista eu tinha obrigação de saber, confesso que no momento senti dificuldades, afinal o nosso samba é em 2/4 sincopado e eu sentia dificuldes em dividir em 5/4, mas com suas orientações achei a maneira correta de executar a divisão e acabei sendo considerado por muitos o baterista que conseguia tocar o 5/4 sem perder o balanço do nosso ritmo. Mario Albanese é uma criatura incrível, um dos grandes amigos da minha juventude (que saudade !) a quem faço questão de enviar um enorme abraço. Na minha modesta opinião o jequibau foi sucesso nos Estados Unidos em função da qualidade do estudo daquele país. Sou do tempo em que o baterista tinha de estudar sozinho ou com métodos de Gene Krupa, Bad Rich e outros precursores do instrumento. Dei muita sorte porque tive professores importantes como o maestro Hervé Cordovil, Osmar Milani, Daniel Alberto Salinas. No instrumento tive o baterista Dirceu o mais técnico do Brasil na época, do contário não teria executado meu instrumento como se deve, e assim vi muitas promessas se perderem pelo caminho. Ao meu querido amigo MAESTRO CIRO PEREIRA, ele que agora acaba de receber a batuta da orquestra do céu, imagino a sua felicidade, ele que tanto amor devotou á música, terá a mais surpreendente orquestra celestial para reger, e o coral de anjos mais afinado, afinação que ele sempre exigiu de seus músicos, e agora vai ouvi-la com todo o esplendor, boa sorte maestro e até já.

A Jazz Sinfônica: criação de Cyro Pereira


VEJA.COM 15/06/2011



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