segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

LUÍS PIMENTEL

Música brasileira na veia




Por Julio Cesar Cardoso de Barros


A revista Música Brasileira, impressa entre 1996 e 2001, teve sua circulação interrompida por causa de dificuldades financeiras, mas encontrou um caminho de sobrevivência na internet. Dirigida pelo jornalista e escritor Luís Pimentel, ela se mantém ativa na imprensa virtual traçando perfis, dando notícias e preservando a memória da melhor música brasileira.

 
Música Brasileira: revista virtual                              

Baiano do sertão de Itiúba, onde nasceu em 1953, Pimentel chegou ao Rio para estudar teatro e acabou se tornando jornalista e escritor. Como jornalista, trabalhou no Pasquim (1976/77), Pasquim21 (2002), na edição brasileira da revista americana de humor MAD, na Rio-Gráfica e Editora e no jornal Última Hora. Foi articulista do jornal carioca O Dia e colunista do virtual Jornal de Copacabana, entre outras colaborações. Com várias dezenas de livros publicados, entre infantis, de humor (Entre Sem Bater: o Humor na Imprensa Brasileira), biografias (Wilson Batista, Luiz Gonzaga), contos (Contos para Ler Ouvindo Música), poesia e ficção, Pimentel coleciona prêmios literários. Entre eles, o Prêmio Cruz e Sousa, por Grande Homem Mais ou Menos, e o Prêmio Jorge de Lima, com as poesias de As Miudezas da Velha. Pimentel também escreveu roteiros para programas humorísticos de TV, como Escolinha do Professor Raymundo e Zorra Total. Seu mais recente trabalho na área editorial é a coordenação da edição de Paixão e Ficção – Contos e Causos de Futebol, do qual participa ainda com um dos textos, ao lado de Aldir Blanc, Armando Nogueira, Mário Filho, Renato Maurício Prado e Zico. No livro Zico, conta como foi o dia em que Ronaldo teve uma convulsão, na Copa da França. A produção tão profícua do escritor não supera em dedicação o amante da MPB. Razão pela qual ele mantém no ar, com dificuldades, mas com vontade, a revista Música Brasileira.

Luiz Gonzaga: biografia 

 Fala, Pimentel!


Com quantos anos você deixou Itiúba?Em Itiúba, eu só nasci. Fui criado desde pequenino em Feira de Santana, cidade que adotei como terra natal, porque foi ali que comecei a enxergar o mundo, a frequentar escola, a aprender as primeiras brincadeiras, a trabalhar bem pequeno, vendendo laranja na porta do estádio de futebol e folhas de bombril na feira livre. Foi ali que me apaixonei pela palavra. Primeiro a palavra cantada, por meio de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e Waldik Soriano. A literatura eu só conheci depois.

 Você veio para o sudeste maravilha como um pau-de-arara ou com o papai bancando a conta?Como pau-de-arara mesmo, só que num ônibus comercial da Itapemirim, pela Rio-Bahia, atravessando as Minas Gerais. Aliás, nem pai eu tinha (morreu quando eu era recém-nascido). Fazia curso na Escola de Teatro, em Salvador, e transferi para o Rio. No último semestre tive que abandonar, porque as aulas eram durante o dia e os biscates que eu fazia não seguravam mais a onda da sobrevivência; larguei o teatro e fui trabalhar na Editora Vecchi, na redação da revista MAD. De lá para a Rio Gráfica, Última Hora, comecei a colaborar com o velho Pasquim, e nunca mais larguei o jornalismo. Ao mesmo tempo, fui fazendo também literatura, hoje tenho uns 30 livros publicados, a maioria para o público infanto-juvenil, além de ficção, poesia, textos de humor e sobre personagens ou aspectos da música brasileira.
 No que você trabalhou, inicialmente?Antes de começar com jornalismo – primeiro, nas redações; faculdade veio depois – fazia artesanato, vendendo pecinhas (que o cartunista Luscar chamava de “piroquinhas de cachorro”) em barraquinhas do Largo do Machado e feiras onde se reunia uma porrada de bichos-grilos.

Futebol: paixão e ficção

 Você chegou a fazer teatro no Rio?Um pouco. Na própria escola de teatro e algumas peças infantis (participei da última montagem em que trabalhou o ator Manfredo Colassanti, pai da Marina e do Arduíno). Abandonei quando deixei a escola, porque os ensaios também costumavam ser à tarde.

 Nos anos 70 você investiu na carreira de jornalista pelas portas da imprensa alternativa e dos quadrinhos, como foi isso?Eu já garantia o ganha-pão na Vecchi, quando criei uma revista alternativa, chamada A Roleta (de textos e desenhos) e comecei a escrever para nove entre dez publicações do gênero – sem receber um puto, jamais.

 Aí você foi para a grande imprensa e trabalhou em quase todos os jornais cariocas.Trabalhei na Última Hora, n’O Dia, no Jornal do Brasil (numa das passagens, editando o Caderno B), no  Extra, O Pasquim e revista Bundas (nesses dois últimos, como editor executivo, carregando o piano pro meu amigo Ziraldo tocar!), colaborei com outros tantos jornais e revistas. E na televisão, como redator de alguns programas humorísticos da Globo – o mais longevo foi a Escolinha do Professor Raymundo, onde fiquei até o programa acabar.

 Você é autor de mais de trinta livros. Além desses, tem idéia de quantas são as coletâneas em que meteu a colher, coordenando, editando ou apenas colabrando com um texto?Coletâneas são umas 20 – para algumas me convidaram, para outras me ofereci e fui aceito. Sou franco-atirador, não tenho vergonha de oferecer o meu trabalho, nunca tive.

Entre Sem Bater: humor 

 Quais prêmios que você ganhou no ofício de escritor?Vários. Alguns até importantes, como o Prêmio Nacional Cruz e Souza, o Prêmio Nacional Jorge de Lima, o Literatura Para Todos, do Governo Federal (com narrativas infanto-juvenis) e o Prêmio Nacional de Dramaturgia Cidade de Belo Horizonte, com uma peça de teatro inspirada na vida e obra do grande compositor Assis Valente, uma de minhas paixões.

 Sendo poeta e ligado à música, é claro que você é também letrista. Tem alguma música gravada?Tenho várias parcerias musicais, nenhuma ainda gravada. Tenho muita coisa com o Sandro Dornelles, um samba com Nilze Carvalho, outro com Luiz Flávio Alcofra, com Lucas Porto, tudo gente muita boa. Uma hora alguém grava alguma coisa.

 Como surgiu a idéia da revista Música Brasileira?Era um sonho antigo, que consegui realizar em 1996, quando comecei a namorar minha atual mulher e ela tinha um escritório de programação visual. Como o amor é cego, ela topou fazer toda a arte da revista e ainda me aceitar como sócio, para fazer com que a empresa dela virasse também editora, para viabilizar a loucura. Não me arrependi, sei que fiz um trabalho bacana, honesto e até um pouco inovador. Um dia o Nelson Sargento me disse: “Sua revista é tão importante quanto a que o Lúcio Rangel fez nos anos 50″ (chamava-se Revista da Música Popular). Nunca esqueci. E acreditei. Só depois vi a revista do Lúcio, numa edição especial fac-similar da Funarte. Muita gente importante da MPB teve a primeira matéria a seu respeito publicada na revista Música Brasileira. Serviu muitas vezes de pauta para alguns cadernos culturais da grande imprensa. E digo isto sem arrogância, mas também sem falsa modéstia.

A Casa no Meio do Mato: infantil

 Você sempre esteve no comando da redação?Sempre estive no comando e na infantaria. Fui diretor, editor, redator, repórter, diagramador, distribuidor… ia pegar as colaborações pessoalmente na casa dos amigos que colaboravam (todos gratuitamente) e carregava no ombro para as poucas livrarias que aceitavam expor e vender a revista, que tinha tiragem mínima e não interessava a distribuidores.

 Em 2001 a grana ficou curta e a revista deixou de ser impressa, certo?Curta, a grana foi sempre. Em 2001 radicalizou. Eu achava que ia conseguir anunciantes que poderiam mantê-la, mas não sei vender anúncios e a venda em livrarias não era suficiente para cobrir os custos industriais. Migrou para a internet, e lá está desde então, novamente com a ajuda de amigos que escrevem e de amigos que cuidam da parte gráfica e técnica, do webdesign. 


 A edição virtual é viável economicamente?Jamais. Nunca entrou um centavo, apesar das tentativas de vender espaço. Mas temos esperança, tanto eu quanto os bravos Leonardo Rocha e Heron Rocha, da empresa Interligar, que põe o site no ar, que ainda vamos viabilizar também esse lado.


 Como você vê o panorama da música brasileira? Que novidades de qualidade se vislumbram no horizonte?Assim que nem você, sou sempre otimista quanto ao panorama (criativo, não de mercado) da música brasileira. Continuo apaixonado por ela, achando que quanto mais a indústria fonográfica dá cabeçada, mais surgem grandes talentos, compondo, cantando, surpreendendo. Acho que ela é assim desde Noel Rosa, nunca desafinou!

VEJA.COM 19/07/2010

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