sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

A FAMÍLIA MUSICAL É SHOW

Martinho da Vila e a filharada 

 Maíra Freitas, Martinho e Mart’nália: show da família musical

Por Julio Cesar Cardoso de Barros

Na casa do Martinho da Vila nem todo mundo bebe, mas todo mundo samba e todo mundo é bamba. Por esta razão, ele reuniu seis de seus oito filhos, uma garotada que se dedica à música profissionalmente, para gravar o CD e DVD Lambendo a Cria. O projeto foi sendo tocado no ritmo sossegado de Zé Ferreira. Na medida em que a agenda do velho partideiro coincidia com a dos filhos, eles entravam em estúdio e faziam as gravações. E assim, aos poucos, Mart’nália, Juju Ferreira, Maíra, Analimar, Tunico e Preto Ferreira registraram as 16 faixas do disco, que foram reduzidas a 14 no DVD. Nesse período, Maíra Freitas, a filha pianista que estudou no conservatório da Universidade Federal do Rio de Janeiro e já participou com destaque de concursos internacionais, lançou seu primeiro álbum e Martinho lançou o CD Poeta da Cidade, no centenário de Noel Rosa, que no ano passado foi tema de sua escola, a Unidos de Vila Isabel, num enredo de sua autoria. O disco, lançado no dia 7 de maio, durante homenagem que Martinho recebeu em Duas Barras, sua cidade natal, reuniu antigos sucessos do sambista e de seus parceiros, e músicas inéditas, que geraram clipes incluídos no DVD. O disco abre com o tema instrumental que lhe dá título, numa levada de baixo, surdo, cuíca e cavaco, cheia dos oi oi ois de que Martinho tanto gosta, com participação da “Família Musical”, o clã familiar do artista ampliado pelo bom time de músicos – Paulinho Black (bateria), Ivan Machado (baixo), Wanderson Martins (cavaquinho), Kiko Horta (acordeom e teclado), Cláudio Jorge (violão e guitarra), Gabriel de Aquino (violão), Victor Neto (sopros), Marcelinho Moreira e Tunico Ferreira (percussão) e Analimar, Juju e Paula Tribuzy (coro). O disco segue com Na Minha Veia (Martinho e Zé Catimba) um samba de romantismo derramado, mas na levada do velho Martinho, que devora as notas com a malandragem do gato, mamando e miando. Gracias a La Vida, de Violeta Parra, ganha uma versão em português com Paula Tribuzi e Martinho. Um violão profundo (Gabriel de Aquino) introduz Todos os Sentidos(Martinho), faixa  na qual a voz do sambista se exibe jovem como a dos próprios filhos, mostrando que ele tem lenha à beça para queimar.

Martinho da Vila e seus oito filhos: só dois ficaram de fora do disco

Piano de sobra, como não poderia deixar de ser, no arranjo de Jobiniando (Martinho e Ivan Lins), em que o poeta da Vila divide o vocal com Maíra Freitas. Lara (Martinho e Zé Catimba) é uma homenagem a Ivone Lara, a grande dama do Império Serrano, na levada manhosa com a filha Mat’nália, que também aparece na faixa seguinte, O Amor da Gente (Martinho e Roque Ferreira) e Casa de Bamba (Martinho), esta última uma  música do primeiro disco do sambista, de 1969.Vivo Pra Sentir Seu Prazer (Tunico Ferreira) é um balanço na medida para que Tunico revele brilho próprio como cantor e compositor da bela canção que fez em homenagem a Ana Lúcia, sua mulher. Que Bom (Martinho da Vila e Dudu Nobre), levado por Analimar, é um samba de bloco, um belo embalo montado numa base de taróis de avenida. A marcha-rancho Volante com Cachaça não Combina, do grande violonista e compositor Cláudio Jorge em parceria com Mauro Diniz, o talentoso filho de Monarco, é um apelo à direção responsável, que Cláudio leva com categoria. Melô do Xavier (Martinho e Wanderson Martins) é uma marchinha carnavalesca que narra em tom gaiato a história do gajo que anda matando jacaré a beliscão, “abusando da minha mão”, história gaiata cantada por Wanderson e Paulinho Black. Cuca Maluca (Gracia do Salgueiro) cantado por Ovídio Britto, que morreria logo depois das gravações, é um partido alto com refrão puxado para o samba de roda, hit obrigatório nos bons pagodes. Filosofia de Vida(Martinho da Vila/Marcelinho Moreira/Fred Camacho) fala da essência da “família musical” de Martinho, que “só quer o que precisa pra viver o dia-a-dia”, na voz de Marcelinho Moreira. O partido alto reaparece com força no Linha do Ão (Martinho), no qual Kiko Horta e Victor Neto vão rimando com palavras terminadas em ão, como o título recomenda pois, se o improvisador falhar, a rima é recomposta com castigos aplicados na palma da mÃO. Na mesma faixa aparece Calango Vascaíno (Martinho), um antigo sucesso lançado em 1974, no LP Canta Canta Minha Gente. Por fim, duas faixas bônus no CD:  Noel Rosa – A Presença do Poeta,  lindo samba-enredo de Martinho com o qual a Vila Isabel desfilou em 2010, um dos sambas mais bonitos que o Sambódromo já ouviu. E Cruz e Souza, Cria Lambida (Martinho), no qual o paxá da Vila conta com apoio de mais um filho, Preto Ferreira, para encerrar o disco fazendo homenagem ao poeta expoente do simbolismo, num  estilo calangueado. Mais um disco criativo a demonstrar o talento inato do homem de Duas Barras.



VEJA.COM 10/07/2011



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